TV Cultura II

Por Cássio Borges

Vou continuar neste artigo os comentários que fiz no artigo anterior, publicado por este jornal no dia 19 último, sobre o debate havido no programa Opinião Nacional, da TV Cultura de São Paulo, no dia 13/03, sobre o Projeto da Transposição.

O pesquisador João Suassuna, um dos mais contundentes críticos desse projeto, em sua fala, fez referência à existência de 37 bilhões de metros cúbicos de água acumuladas no Semi-Árido nordestino, valor este, segundo ele, muito superior aos insignificantes 1 bilhão de metros cúbicos (26,4 m3/s) que se pretende transpor, anualmente, do Rio São Francisco e que só o açude Castanhão, no Estado do Ceará, dispõe de 28 m3/s. Disse que os estudos feitos pelo professor João Abner, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte concluíram que só o Estado do Ceará dispõe de uma vazão útil de 215 m3/s sendo, portanto, auto-suficiente em recursos hídricos. Informou que, à Siderúrgica que vai ser implantada no Porto do Pecém, vai ser destinada uma vazão que daria para abastecer uma cidade de 90.000 habitantes. O Coordenador do Debate, jornalista Alexandre Medeiros, concedeu-me, então, a palavra para comentar o que havia declarado o pesquisador João Suassuna:

Inicialmente, informei que, realmente, o Nordeste brasileiro dispõe de um volume acumulado da ordem de 37 bilhões de metros cúbicos, uma fabulosa infra-estrutura hídrica implantada pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas-DNOCS. Disse que o professor João Abner não havia feito nenhum estudo próprio para chegar à conclusão de que o Estado do Ceará dispõe de 215 m3/s e que em março de 2005, na Assembléia Legislativa do Estado do Ceará, quando nós ambos debatemos este assunto pela primeira vez, o professor Abner disse que tinha obtido tal informação em um site da Companhia de Gestão de Recursos Hídricos do Estado do Ceará-COGERH. Portanto, não foi fruto de nenhum estudo ou trabalho por ele realizado. Por mais otimista que seja o estudo já realizado, ou por ser realizado, todo o Estado do Ceará só dispõe de, no máximo, 90 m3/s, em número redondo.

Quanto ao açude Castanhão ter 28 m3/s isto, também, não corresponde à realidade pois, segundo me consta, aquele reservatório só dispõe de 19 m3/s, com 100% de garantia (confiabilidade). Disse eu que não devemos confundir dados hidrológicos com dados estatísticos, pois 28 m3/s, de conformidade com a Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará, correspondem a uma vazão com 90% de garantia, isto é, que o açude pode secar uma vez a cada dez anos. (Note-se que a hidrologia, em qualquer parte do mundo, sempre se refere à vazão regularizada com 100% de garantia). No Semi-Árido nordestino este conceito de 90% de garantia é inadequado tendo em vista que aqui temos tido períodos críticos com até sete ou oito anos consecutivos. Cabe aos agrônomos e economistas se utilizarem de dados estatísticos (conceito de garantia ou confiabilidade) para avaliar os riscos (vantagem ou desvantagem) da utilização de uma vazão maior do que a fornecida pela hidrologia. O importante é esclarecer que o açude Castanhão só dispõe de 19 m3/s.

Quanto ao fato de, para a Siderúrgica do Pecém ser destinada uma vazão equivalente ao abastecimento de uma cidade de 90.000 habitantes, não vejo nisso o absurdo que nos pareceu querer passar o Dr. João Suassuna pois, para abastecer uma cidade com esse porte habitacional, a vazão necessária seria em torno 0,2 m3/s, bastante insignificante face a importância sócio-econômica da transposição. Qual, então o problema?

Fonte: Opinião – Jornal O Povo