O Açude e a Cidade
Por Cássio Borges
Sou leitor assíduo dos artigos do Dr. Antônio Mourão Cavalcante. No intitulado “O sertão vai virar mar”, publicado, neste jornal, no dia 24/10 p.passado, o desfecho do mesmo coincide com o que sempre considerei em relação à atenção exagerada dos governantes à capital, em detrimento da população interiorana. Ele escreveu: “No concreto, uma Fortaleza cada vez mais inchada, para aonde tudo converge e um sertão entregue à própria sorte”. E mais adiante: “O sufoco na Capital e o abandono do Interior”.
Permitam-me os leitores deste jornal tomar o mote desse artigo do Dr. Antônio Mourão e ele próprio, para retomar a questão da construção da barragem do Castanhão, assunto que demandou mais de 12 anos de acirradas discussões, que as agências governamentais, na atualidade, se esforçam para fazê-las cair no esquecimento, ou, simplesmente ignorá-las. Tenho ouvido falar que o açude Castanhão “está abastecendo Fortaleza”, o que não é verdade. Em outras oportunidades, afirmam que o referido reservatório é uma “alternativa” para o abastecimento da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Ora, se o açude Orós, através do Canal do Trabalhador, salvou Fortaleza do caos no ano de 1993 (não existia o açude Castanhão), é evidente que ele continua sendo, com seus 12 metros cúbicos/segundo de vazão regularizada, uma “alternativa” válida para uma idêntica eventualidade. Outra “alternativa” é o Projeto São Francisco, cuja vazão destinada aos Estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte é de 18 m3/s, cabendo ao Estado do Ceará 8 m3/s.
Também não tem fundamento a afirmação de que o açude Castanhão é o “pulmão” do Projeto de Interligação da Bacia do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional. Qualquer pessoa que tenha um mínimo de conhecimento de topografia conclui esta verdade, pois aquele reservatório está a apenas a 150 quilômetros do mar, construído na cota 55 metros do leito do rio Jaguaribe.
Na realidade, até hoje, após mais de seis anos da barragem do Castanhão ter sido construída, nenhuma das alternativas, acima citadas, foi necessária. Ou, mais precisamente, de 1998 para o atual ano de 2009, já decorridos 13 anos, sem que nenhuma das alternativas referidas tivesse sido acionada. A própria transposição de vazões do rio São Francisco estaria ociosa nesse período. Portanto, o açude Orós socorreu a RMF em duas oportunidades, em 1993 e 1998.
Outrossim, considero pouco provável a projeção, ou prognóstico, de que as águas do açude Castanhão poderão ser demandadas para reforçar o abastecimento da RMF até o ano 2015. Para que tal fato possa acontecer, seria necessário que a população fortalezense e adjacências, dentro de cinco anos, no mínimo, dobrasse. Ou seja, que os atuais 7 m3/s consumidos pela RMF passasse, digamos, para 14 m3/s. E mesmo se isto pudesse acontecer, que é improvável, o açude Orós, mais uma vez, poderia contribuir com seus 12 m3/s de sua vazão regularizada, mais do que suficiente para atender a uma situação eventual deste tipo. E, consequentemente, o açude Castanhão e o Projeto São Francisco continuariam ociosos em relação ao suprimento de água para a RMF.
Fonte: Jornal O Povo