A polêmica sobre a futura gestão da transposição do rio São Francisco


Por Cássio Borges

Os caminhos e descaminhos da transposição

O início da operação da transposição do rio São Francisco ainda não tem data marcada mas a gestão do projeto já é motivo de polêmica e controvérsia.

Na última reunião da Sociedade Cearense de Geografia e História,da qual sou membro efetivo, solicitado pelo seu presidente, Vicente Alencar, fiz breve exposição sobre o meu mais recente livro “O Nó Górdio da Transposição”. Iniciei falando sobre o título do livro dizendoque a expressão “nó górdio” é uma lenda grega que significa dizer queproblemas complexos podem ser resolvidos de forma simples e eficaz. Éo caso, por exemplo, do Projeto da Transposição de Vazões do Rio São Francisco que pelo Decreto Presidencial no 5995, de 19 de dezembro de 2006 (final do primeiro mandato do Presidente Lula da Silva) dizia que a operacionalização da gestão da infraestrutura do Projeto de Integração do Rio São Francisco-PISF caberia a uma das instituições vinculadas ao Ministério da Integração Nacional, DNOCS ou CODEVSF, ou a uma entidade que seria especialmente criada para este fim.

Entretanto, os tecnocratas de Brasília, onde se concentram atualmente as grandes decisões sobre o destino da problemática hídrica nordestina, decidiram entregar essa missão à CHESF-Companhia Hidrelétrica do São Francisco que gerou discussões naquela empresa terminando por aquela Companhia desistir desta missão. Segundo soube, uma das razões seria a complexa cobrança dos usuários da água ao longo dos 700 quilômetros de canais (adutoras e canais principais), sem falar nos canais terciários, secundários e quaternários. Um problema complexo para ser encarado por qualquer organismo que venha a ser indicado para a operadora daquele empreendimento que se pretende seja autossustentável. A meu ver, uma visão distorcida da real finalidade do mesmo que é dar de beber a quem tem sede e evitar o êxodo rural em épocas de seca.

Os açudes do DNOCS, estes sim, continuarão com a política socioeconômica de irrigação em nossa Região agora com o incremento de suas vazões regularizadas graças a sinergia recebida do Projeto de Integração do Rio São Francisco, ou seja, os técnicos do DNOCS não terãomais a preocupação dos açudes secarem pois, na eventualidade, contarão com o suprimento da água vinda do mencionado projeto para atender as necessidades básicas humanas e animais.

Após a tentativa da CHESF, no final do segundo mandato do ex-Presidente Lula da Silva (em outubro de 2010), os tecnocratas de Brasília optaram pela criação de uma nova entidade, desprezando, mais uma vez, as entidades vinculadas ao Ministério da Integração Nacional, DNOCS eCODEVASF. Em 25.10.2010 escrevi um artigo publicado na imprensa do Ceará e de Pernambuco intitulado “O Nó Górdio da Transposição” no qual eu dizia “que seria uma insensatez a criação dessa entidade já que existia o DNOCS com toda a sua centenária experiência, internacionalmente reconhecida e possuidora da maior e mais bem montada infraestrutura técnica, administrativa e operacional em toda a região nordestina”.

No artigo citado, apresentei fortes argumentos contrários ao pensamento segundo o qual a “cobrança pelo uso da água” seria um eficiente instrumento de gestão da água em nossa região e que a nova entidade, que seria criada, somente funcionaria 40% o tempo, ficando 60% dos anos ociosa. Tão fortes foram as razões ali apresentadas que soube, por portas de travessa, que o ex-Presidente Lula da Silva, no apagardo seu segundo mandato de governo, teria mandado reestudar este assunto para uma posterior decisão. Durante quase quatro anos não se falou mais neste assunto.

Verdadeira ou não esta versão, o fato é que somente no final do Governo de Dilma Roussef, já tendo como Ministro da Integração Nacional o cearense Francisco José Coelho Teixeira, foi editado o Decreto 8.204, de 14/034/2014 “que dispões sobre a transferência da gestão à CODEVASFde todo o Programa de Integração do Rio São Francisco no Nordeste Setentrional”. No meu entendimento, o fim do DNOCS, sem que fosse preciso, como fez FHC, editando a Medida Provisória no 1.795, de 01/01/ 1999, sentenciando a extinção sumária daquele Departamento.

Com base nos fatos acima, a tradicional e conceituada Sociedade Cearense de Geografia e História, no dia 28 de agosto último, enviou carta para o referido Ministro, protestando contra a indicação da CODEVASF para ser a operadora do Projeto de Integração do Rio São Francisco, cujos trechos da  transcrevo a seguir:

“Senhor Ministro, V.Exa., como cearense que é, sabe tanto quanto eu e os confrades da Sociedade Cearense de Geografia e História, o que tem representado o DNOCS para o desenvolvimento de nossa Região e, com mais ênfase para o Estado do Ceará. Portanto, consideramos um erro inominável entregar à CODEVSF o comando do referido projeto, empresa que nunca produziu nada, absolutamente nada, para o nosso Estado, tomando este como referência em relação aos demais Estados nordestinos”.

“E nossa decepção assoma não apenas pelo motivo acima, mas também em face da constatação de que a CODEVASF somente tem experiência em irrigação (uma das cinco atividades do DNOCS na região nordestina) no vale do Rio São Francisco, portanto em um rio perene que não tem necessidade de açudes”.

“Em face do que acima foi exposto, qual o fundamento básico em que esse Ministério se esteia para indicar a CODEVASF como gestora desse complexo empreendimento? O que entende a CODEVASF de açudes se o órgão nunca construiu e nem operou nenhum?”

“Senhor Ministro, só podemos concluir esta correspondência dizendo, a par de nossa indignação diante de fato tão absurdo, que o DNOCS merece o máximo de respeito e admiração de todo o povo nordestino”

“Portanto, em nome dos que fazem a Sociedade Cearense de Geografia e História, vimos solicitar a V.Exa. para que seja revogado o mencionado decreto presidencial”.

O que têm a dizer e a fazer os parlamentares da bancada federal cearense diante de tamanho absurdo com consequências gravíssimas para o nosso Estado e para a nossa Região?

Fonte: Blog InfoBRASIL