Quando o erro jurídico não tem conserto – pena de morte e o medo do erro (por injustiça ou por política?)


Por Clésio Jean Saraiva

Dos Estados Unidos vem a notícia de que um condenado à pena de morte aguardou trinta anos no corredor da morte até que teve sua inocência comprovada. Aludindo a questão posta, pode-se, como exemplo, usar um curioso caso ocorrido no Brasil no século XIX.

No dia 06 de agosto de 1855 foi executado o último condenado à morte, execução essa dada pela forca. Manoel da Motta, um rico e influente político fazendeiro de Macaé, Rio de Janeiro, foi acusado de ter assassinado oito pessoas, todos membros de uma família de colono os quais prestavam serviços na fazenda de propriedade do acusado. O caso repercutiu em toda a população da cidade do Rio de Janeiro que o apelidaram de Fera de Macabú, região sede da dita fazenda. Essa atitude popular acabou por pressionar os políticos da época, que, por questões também políticas de interesse, exigiram a condenação de Motta por terrível crime.

Contudo e, de forma desesperada, Motta apresentou álibi e juras de inocência e nunca procurou escusar à lei e tão menos pôr-se em fuga, pois, segundo dizia, dormia em paz com sua consciência, alegando que a justiça de Deus e a divina providência provariam sua inocência.

Solicitou o perdão do então Imperador Dom Pedro II, único que poderia impedir sua execução, mas esse, pressionado pela população e pelos políticos, interessados na falência da fazenda de propriedade de Motta e a sucumbência política que então esse exercia em detrimento daqueles interessados em sua condenação, não concedeu a clemência e Motta então foi enforcado. Foi o primeiro homem rico, influente na economia e venerável aristocrata enforcado no Brasil.

Mas os juristas da época, intrigados com o caso e com a posição inabalável de Motta que, com cabeça erguida e sorriso no rosto, enfrentou a carrasca corda em seu pescoço, decidiram dar continuidade às investigações e acabaram por constatar a inocência do fazendeiro, chegando à verdadeira pessoa do referido crime. Esses juristas levaram o caso ao Imperador que, envergonhado, defendeu a conduta moral dos juízes e publicamente pediu perdão à família de Motta, abrindo novo processo ao verdadeiro criminoso e seus mandantes.

Desde então Dom Pedro II passou a dar clemência a todos os condenados à morte, forçando, tanto o judiciário da época, como aos políticos, abolirem a idéia da pena de morte, pois, não importava-se mais a condenação à morte, tendo na figura do Imperador o perdão, ou seja, a pena de morte passou, nessa época, ser uma sentença sem sentido, dado o Imperador deixar claro que nenhum brasileiro seria mais submetido a possível e irreparável erro (isso porque, mesmo depois do incidente, os políticos de época mantiveram a pena de morte no código penal). Entendeu que depois de executada a sentença de morte, como se voltaria atrás? Foi só com o advento da República que esse artigo foi abolido definitivamente do código penal brasileiro. Outrossim, com o advento da ditadura militar, a pena de morte voltou a desesperar a população, isso posto com a instituição do AI-5 em 1969 a qual autorizava o Estado a condenar à morte qualquer pessoa por crimes políticos, no entanto, também por questões políticas, acabou-se por nunca executar ninguém, ao menos de forma legal, ou seja, de forma pública e oficial.

Mas o fantasma ainda ronda os brasileiros, pois na atual constituição, a pena de morte pode ser aplicada em casos em que o país se encontre em situação de guerra declarada, oportunidade política a “sumir” com aqueles contrários à ordem posta; tal como foi no caso Motta em 1855.

TEXTO ORIGINAL DA ORDEM DOS GREGÁRIOS.

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