Sem o Dnocs como estaríamos?
Por Clésio Jean Saraiva
O Engenheiro Arrojado Lisboa, em pronunciamento proferido numa conferência realizada a 28 de agosto de 1913, portanto há 100 anos, assim definia seca: “Seca, no rigor léxico, significa estiagem, falta de umidade. Da chuva provém a água necessária à vida na terra. O problema das secas, assim encarado, seria simplesmente o problema da água, isto é, o do seu suprimento. Mas a palavra seca, referida a uma porção de território habitado pelo homem, tem significado muito mais compreensiva. Com efeito, o fenômeno físico da escassez da chuva influi no homem pela alteração profunda que dela decorre para as condições econômicas da região que, por sua vez, se refletem na ordem social.
Assim encarada, a seca é um fenômeno muito vasto, de natureza tanto física, como econômica e social. O problema das secas é, portanto, um problema múltiplo. Verdadeiramente não há um problema, – há problemas “
Corrobora este entendimento o relato a seguir advindo dos vários problemas acarretados pelas secas.
“A mais remota seca conhecida no Brasil data dos meados do século XVI e foi observada nos sertões do São Francisco por uma das entradas em busca das esmeraldas. Há tradições de secas em 1614, mas a de 1692 que assolou principalmente Pernambuco, é a primeira reconhecidamente autêntica. O século XVIII foi principalmente de chuvas excessivas, pelo menos oito anos salteados de pesadas chuvas. O de 1748 trouxe grandes chuvas gerais desde o extremo Norte ao Sul da região semi-árida, do Ceará à Bahia. Também oito secas ocorreram nesse mesmo século, das quais três ficaram memoráveis: a de 1721, do Ceará a Pernambuco; a de 1777, que destruiu sete oitavos do gado do Ceará e do Rio Grande do Norte e a grande seca de 1793, que passou por todas as, então, Capitanias do Nordeste.
O século XIX viu dez grandes invernos e sete grandes secas. Destas, a de 1845 teve gravíssimas conseqüências para o gado e a de 1877, que se prolongou até 1879, tornou-se notável pela perda de vidas que acarretou ao homem. Em todo o sertão ainda a denominam hoje a “grande seca”. Esta determinou a mortandade de 500.000 habitantes do Ceará e vizinhanças, ou cerca de 50% da população. Nas grandes secas em geral, porém, a média da mortalidade não costuma exceder 33%. Dos mortos de 1877 a 1879 calcula-se que 150.000 faleceram de inanição indubitável, 100.000 de febres e outras doenças, 80.000 de varíola e 180.000 de alimentação venenosa ou nociva, de inanição ou mesmo exclusivamente de sede. Calculou-se em 2.000.000 a perda de vidas, em conseqüência das secas, de 1877 a nossos dias. Apesar de elevado, este número não é comparável aos algarismos indianos. Só de 1899 a 1901 pereceram 1.000.000 de habitantes com a última grande fome na índia. Na grande fome de 1876, nas províncias indianas de Bombaim, Madrasta e Misory, pereceram cinco milhões de pessoas.
Os treze anos deste século têm sido de muito boas chuvas, apenas pequenas secas parciais. O ano corrente é de forte seca na Bahia. Se nós não contarmos grandes secas no século XX, delas não escaparão nossos filhos, podereis estar disso seguros. A reprodução do fenômeno físico é inevitável.
Repitamos: o caráter das secas ou dos invernos chuvosos é a irregularidade, sempre a irregularidade. Catalogar as secas, omitindo as grandes invernadas, concluir sem exame detalhado das circunstâncias no tempo e no espaço, é obra de romancista.”
Que clarividência, quanta atualidade numa conferência realizada a 28 de agosto de 1913, antes, portanto, da edição da famosa obra literária O Quinze, da imortal Rachel de Queiroz, que retratou a grande seca ocorrida dois anos após a conferência do eminente engenheiro. Como estava certo o experiente engenheiro Arrojado Lisboa, não só ocorreram grandes secas ao longo do século XX, como também foram observados anos de grandes invernadas, restando provado o caráter cíclico do fenômeno climático, o que acarreta a certeza da sua ocorrência no século atual, o que já se confirma com a ocorrência de seca em 2012 e 2013, podendo, de acordo com a FUNCEME se repetir em 2014, provocando colapso hídrico em todas as capitais nordestinas e nos sertões em geral.
O pior só não aconteceu por obra e graça das obras do IOCS depois IFOCS e hoje DNOCS. Foram construídos 319 açudes públicos, dentre eles, Castanhão, cuja acumulação de 6 bilhões e 700 milhões de metros cúbicos em potencial, com seus atuais 39% de capacidade acumulada, garantem água para mais um anos de seca, se for o caso. Foram construídos também mais de 600 açudes em regime de cooperação e algo em torno de 120 açudes em convênio com vários municípios, totalizando aproximadamente 1.039 reservatórios de médio e grande porte. A par da construção dos reservatórios o DNOCS promove o aproveitamento hidro-agrícola dos seus mananciais quando instala e operacionaliza perímetros irrigados, e desenvolve a aqüicultura com geração de emprego, renda e disponibilização de proteína animal de altíssima qualidade.