Transposição: Contra por quê?
Por Cássio Borges
A insensibilidade de alguns políticos, particularmente dos estados de Sergipe, Alagoas e Bahia, frente aos graves problemas que, periodicamente, assolam a nossa Região e que só a transposição poderá resolver, revela uma completa falta de sentimento de solidariedade e brasilidade entre nós nordestinos. Esses três estados e o de Minas Gerais, inclusive, nada têm a reclamar quanto à retirada de insignificantes 26 m3/s do Rio São Francisco para a interligação desse rio com as Bacias do Nordeste Setentrional. A Bahia, porque essa vazão vai ser retirada e bombeada já no Estado de Pernambuco, depois do Rio São Francisco ter cruzado 900 quilômetros do território baiano e a ele servido. Então, porque é contra?
Identicamente, e com mais razão, não se pode entender o Estado de Minas Gerais, notoriamente riquíssimo em perenes recursos hídricos variados e que fica situado ainda mais longe, a mais de 1.000 quilômetros acima da estação de bombeamento. A essa distância, que tipo de influência pode a transposição exercer sobre aquela poderosa e rica unidade da federação? Só se for do ponto de vista econômico, visto que as exportações das excelentes frutas e hortaliças nordestinas pelos portos do Nordeste serem bem mais viáveis do que as desses mesmos produtos produzidos naquele estado, cuja economia não se funda em fruticultura mas, claramente, em mineração –(Minas Gerais)- e indústrias.
Em outras palavras, não há interesse no desenvolvimento do Nordeste em geral, notadamente, do Setentrional, de riquíssimo potencial agrícola que aguarda apenas água para explodir. Certa vez, afirmei que o ”verdadeiro impacto que move a oposição ao Projeto de Transposição é o político”. Cada vez mais estou convencido de que é verdadeira esta afirmação e, hoje, acrescento: econômico. (Aliás, conforme já confessado publicamente pela coordenadora executiva do Comitê do São Francisco em entrevista à imprensa, publicada em 16.10.05).
O que os políticos e autoridades que se opõem à transposição não deveriam ignorar é o fato incontestável de o Rio São Francisco (cujo curso tem 2.700quilômetros de extensão) se encontrar hoje dividido em dois grandes trechos: o que vai de suas nascentes até a barragem de Sobradinho (no Estado da Bahia) e o desse reservatório até o mar. O primeiro trecho, com cerca de 1.800quilômetros, pode-se dizer, sem muito rigor, ser um rio que ainda se encontra da mesma forma como era à época do descobrimento do Brasil. Já o segundo trecho, o que vai da barragem de Sobradinho até o mar, com cerca de 900 quilômetros de extensão, é de um rio artificialmente regularizado por esse reservatório de 35 bilhões de metros cúbicos de capacidade de acumulação.
Antes da construção da barragem de Sobradinho (um empreendimento federal, diga-se de passagem), a vazão mínima do Rio São Francisco, em sua foz, era de 690 m3/s, hoje, graças a esse gigantesco reservatório –seis vezes maior do que o Castanhão- a vazão mínima passou a ser de 2.060 m3/s, ou seja, foi triplicada! Esse atual valor da vazão mínima, sem considerar a incremental aportada pelos afluentes, notoriamente os situados no Estado de Pernambuco, corresponde à vazão regularizada por Sobradinho -(vazão contínua com a qual esse reservatório nunca secará). Portanto, foi por essa grandiosa obra federal que a vazão do rio foi triplicada em relação àquela observada em sua situação natural, desde os tempos do Brasil colonial.
Essa atual vazão mínima garantida beneficia, com infindáveis sobras, todo o segundo trecho do Rio São Francisco, ou seja, os cerca de 900 quilômetros entre Sobradinho e o oceano. Daí se conclui não ter o menor sentido dizer-se, como o Governador de Sergipe, João Alves, que o rio vai secar com a retirada da ínfima parcela de 26 m3/s. Ademais, é já no final desse segundo trecho que se encontram os estados de Alagoas e Sergipe, os quais se opõem, principalmente o segundo, de forma radical e insensata, ao projeto de transposição elaborado pelo Ministério da Integração Nacional. Reclamar de que?
Por quê tanto medo do desenvolvimento sócio-econômico do Nordeste Setentrional? Por quê não apoiar a Transposição, a única maneira de eliminar o periódico e atroz sofrimento de milhões de brasileiros, com todos inerentes e enormes prejuízos à Nação, e ensejar a economia das vultosas verbas despendidas para socorrer as populações flageladas?
Fonte: Jornal do Commercio – Pernambuco