Transposição do São Francisco
Por Cássio Borges
Neste artigo, desejo esclarecer que a prudência em não utilizar intensamente a água acumulada nos açudes do Semi-Árido nordestino decorre da criteriosa preocupação do Dnocs em ‘‘guardar a água’’ para a eventualidade de uma seca prolongada no porvir. Este tem sido um cuidado, ao longo do tempo, estabelecido por aquele experiente Departamento como regra para a operação dos seus reservatórios que, em média, utilizam apenas 25% do total da água represada.
Armazenar água e saber como utilizá-la para não faltar no futuro, é a regra, ainda hoje em voga, mesmo com a alta perda por evaporação. É o que atualmente se chama de gestão dos recursos hídricos, da qual o Dnocs é precursor no Semi-Árido nordestino, quiçá no Brasil. E ainda há mal informados, que dizem que ‘‘aquele Departamento não tem experiência em gestão de recursos hídricos’’… E, apesar de toda essa precaução, o açude Orós secou no final do ano de 2003, depois de passar 17 anos sem sangrar. E o açude Castanhão, se, na época, já estivesse construído, teria passado 19 anos sem sangrar e, igualmente, teria secado. Um caos…E, ainda, para contrapor aqueles que dizem que o Dnocs não tem experiência em gestão de recursos hídricos, e por um dever de fidelidade à história daquele esquecido Departamento, cito o fato de, em sua saga de pioneirismo, ter dotado, na década de 60, a bacia hidrográfica do rio Parnaíba (PI), com uma das mais modernas redes hidrométricas e meteorológicas do nosso país. O seu objetivo, ao se voltar para aquele importante estado nordestino, era coletar todas as informações necessárias a um planejamento hidro-agrícola, tendo como meta principal a construção, entre outras, da Barragem de Boa Esperança, cuja obra foi idealizada, estudada e levada avante por aquele Departamento, a despeito da oposição vigorosa, ‘a época, de muitos. A Sudene, que veio depois juntar-se ao Dnocs, era uma das mais fortes opositoras a esse empreendimento, de cuja viabilização técnica tive a honra de participar. Isto é o que se chama gestão competente de recursos hídricos para qual o Dnocs sempre demonstrou extraordinária vocação.
Em nossa região, já foram observados trens de anos secos seguidos de até sete (1927-1933) e oito anos (1950-1958) que, no vocabulário dos técnicos do Dnocs, é que são denominados de ‘‘períodos críticos’’ ou ‘‘ciclos secos desfavoráveis’’.A partir desses ‘‘ciclos secos desfavoráveis’’, são determinadas as vazão máximas regularizáveis pelos açudes para usos múltiplos. Não creio que o respeitável cientista Aziz Ab‘Saber, que diz serem ‘‘pseudotécnicos’’ os que defendem esse Projeto da Transposição, sabe disto. Na realidade, existe uma lamentável incompreensão do que seja o Semi-Árido nordestino da Bahia para cima. Por isso, fazem interpretações errôneas sobre as características e peculiaridades hidrológicas de nossa região.Como exemplo, cito a revista ‘‘Veja’’, do dia 12 de outubro do corrente ano, na matéria ‘‘Um rio de dúvidas’’que diz:‘‘No Nordeste ocorre uma seca a intervalos de dez anos’’.É como se, em nossa região, tivéssemos, a cada dez anos, nove anos de chuvas normais e apenas um seco. Isto é irreal.Uma quimera! É uma pena que pessoas despreparadas, embora ocupando cargos importantes, que nunca viram a capa de um livro de hidrologia, ousam falar sobre temas e fatos que desconhecem. E não são poucos os que podem vestir esta carapuça…
Fonte: Opinião – Jornal O Povo