Transposição, Energia e Irrigação
Por Cássio Borges
Logo que o Departamento Nacional de Obras de Saneamento-Dnos (extinto no Governo do presidente Collor de Melo) anunciou, no ano de 1984, o seu projeto visando à transposição de vazões do Rio São Francisco para os Estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, iniciaram-se os primeiros debates contra esse empreendimento sob a alegação de que a sua implantação iria reduzir, significativamente, o potencial energético da Companhia Hidrelétrica do São Francisco-CHESF.
Em sua concepção definitiva, apresentada naquele ano, o projeto do DNOS previa a retirada de 280 m3/s (chegou a ser 320 m3/s) que seriam bombeados do Rio São Francisco na altura da cidade de Cabrobró, no Estado de Pernambuco. A água iria até o açude Aurora que seria construído no município de Aurora (CE) e dali transferida para os rios Piranhas-Açu, nos Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte, e Jaguaribe, no Estado do Ceará. Esse era o projeto original. Não havia o Eixo Leste.
Em meio a essa discussão sobre o aproveitamento dos recursos hídricos do Vale do Rio São Francisco, participei do I Encontro para o Aproveitamento dos Recursos Hídricos da Bacia do Rio São Francisco, realizado em Brasília, em dezembro de 1984, ocasião em que o conceituado engenheiro Otto Pfafstetter (já falecido), do Dnos, especialista em recursos hídricos e irrigação, em defesa do projeto, assim se expressou: ”Eu acho que o posicionamento do problema do conflito da água com a irrigação e a energia elétrica, deve ser abordado de uma maneira nacional, sob aspectos de Brasil, e não completamente restrito à Chesf ou ao Vale do São Francisco. Sob o ponto de vista nacional, nós temos que pensar que o Nordeste é carente de água e energia, então ter-se-á que importar seja água ou energia, ou ambas. Estudos feitos recentemente, têm demonstrado que o transporte de água de outras regiões mais abundantes como o Vale do Tocantins ou da região amazônica é economicamente inviável, logo a única solução é utilizar-se a água disponível na bacia para irrigação, e importar energia, seja lá da Chesf, ou de onde for, desde que seja brasileira”.
A possibilidade das águas do Rio São Francisco serem destinadas, no futuro, prioritariamente, para outros usos mais nobres, como a produção de alimentos, foi ratificada pelo engenheiro José Ailton de Lima, atual Diretor de Operações da Chesf, em palestra por ele proferida na Federação das Indústrias do Ceará-Fiec, no dia 09 de agosto do ano passado. O mesmo pensamento foi esposado pelo engenheiro João Paulo Aguiar, um dos mais conceituados técnicos da Chesf da atualidade, em trabalho por ele apresentado, no ano passado, sob o título ”Transposição de Águas do Rio São Francisco para outras Bacias do Nordeste Setentrional”. Hoje, o mais importante e essencial uso de grandes volumes de água do Rio São Francisco é para geração de energia elétrica. Certamente, daqui a 40 ou 50 anos, os humanos do século XXI nos chamarão de trogloditas por termos construído um reservatório com as dimensões de Sobradinho para geração de energia elétrica. Então, as águas do São Francisco serão prioritárias para outros usos, também nobres, como: a produção de alimentos e novas formas de energia primária (fusão nuclear, solar, eólica, gás, etc.etc.) garantirão a eletricidade imprescindível para o desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida das comunidades.
Em outro trecho de seu trabalho, o engenheiro João Paulo Aguiar, enfatiza que a médio e longo prazos ”outras formas de atendimento à demanda de energia elétrica do Nordeste (solar, biomassa, gás natural, importação de grandes blocos de energia de origem hidráulica produzida no Norte) permitirão que, naturalmente, e na medida em que se intensifique a irrigação, aumente o uso da água nesse segmento e se reduza na geração de energia elétrica, ou seja,”o conflito será equacionado sem conflitos e visando sempre o interesse maior da região”.
Diante do acima exposto, desmorona-se, definitivamente, o principal argumento dos que são contra a Transposição, empreendimento de fundamental interesse e vital para toda nossa Região, especialmente para os 12 milhões de habitantes que vivem na área de influência do projeto que são, periodicamente assolados pelo flagelo das secas. Não é admissível continuar argumentando contra, com base em espúrios e egoísticos interesses estaduais e/ou de comitês de bacias hidrográficas, contrariando aspectos de Brasil, que devem ser, de fato, ”um país de todos”, com mais desenvolvimento e menos desigualdades.
Fonte: Opinião – Jornal O Povo